Vivian Oliveira – Rios de Notícias
MANAUS (AM) – O Amazonas registrou um grave aumento nos índices de homicídios nos últimos anos. De acordo com o Atlas da Violência 2024, divulgado na terça-feira, 18/6, os dados são alarmantes sobre a criminalidade no Brasil. O estudo, realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, revelou um crescimento significativo nos casos de homicídios, acendendo um sinal de preocupação entre autoridades e especialistas em segurança pública.
Segundo o relatório, o Amazonas sofreu uma elevação de 15% na taxa de homicídios entre 2022 e 2023, passando de 38,5 para 43,5 homicídios por 100 mil habitantes. Esse aumento coloca o estado como o quarto mais violento do país, uma posição que não ocupava desde 2018. A capital, Manaus, é a cidade que concentra a maior parte dos casos, refletindo problemas estruturais e sociais que vão além da questão puramente criminal.
Violência contra jovens
No Amazonas, jovens entre 15 e 29 anos representam a maior parte das vítimas de homicídios no estado. Em 2023, foram registrados 1.245 casos nessa faixa etária, um aumento de 18% em relação ao ano anterior. A taxa de homicídios entre este público alcançou 84,7 por 100 mil habitantes, uma das mais altas do país.
“De cada cem jovens entre 15 e 29 anos que morreram no Brasil por qualquer causa, 34 foram vítimas de homicídio. Dos 46.409 homicídios registrados, 49,2% vitimaram jovens entre 15 e 29 anos. Foram 22.864 jovens que tiveram suas vidas ceifadas prematuramente, uma média de 62 jovens assassinados por dia no país. Considerando a série histórica dos últimos onze anos (2012-2022), foram 321.466 jovens vítimas da violência letal no Brasil”, afirma o estudo.
Três Unidades Federativas (UFs), a saber, Amazonas (+19,5%), Piauí (+64,6%) e Bahia (+23,5%) tiveram aumentos significativos na taxa de homicídios de jovens.
Homicídios de pessoas pretas
A população preta no Amazonas também enfrenta índices preocupantes de violência. Em 2023, foram contabilizados 620 homicídios de pessoas pretas, um aumento de 20% em relação a 2022. A taxa de homicídios entre pretos é de 56,2 por 100 mil habitantes, refletindo a persistente desigualdade racial e a discriminação que agrava a vulnerabilidade dessa população.
“Ao contrário do racismo explícito, característico das sociedades de origem anglo-saxônica, germânica ou holandesa, que operou com formas abertas de segregação, no racismo por denegação, ancorado na miscigenação e na assimilação, foram as hierarquias raciais que garantiram a superioridade dos brancos enquanto grupo dominante […], em oposição à inferioridade negra”, esclarece o levantamento.
Homicídios de indígenas
A situação dos indígenas no Amazonas também inquietam. O Estado registrou 38 homicídios de indígenas em 2022, com a taxa de mortes subindo ligeiramente de 47,4% em 2021 para 47,5% em 2022.
Em nível nacional, a tendência de queda na mortalidade indígena por homicídios foi interrompida durante a pandemia, evidenciando a vulnerabilidade contínua dessas populações.
O monitoramento da violência letal contra indígenas, iniciado pelo Atlas da Violência em 2021, revela tanto aspectos físicos quanto simbólicos da violência étnico-racial. Conforme o Atlas, a subnotificação nos registros públicos dificulta a formulação de políticas eficazes.
“A violência étnico-racial, no contexto das proteções públicas do Estado Democrático de Direito, tem uma dimensão física e material, contida através de mecanismos repressivos e coercitivos e outra dimensão simbólica, realizada por diferentes formas de assédio, ameaças e dissimulação. Entre as violências dissimuladas e invisibilizadas estão as subnotificações nos registros públicos, o que dificulta o conhecimento para a formulação de estratégias e a implementação de políticas públicas adequadas ao combate de todas as formas de violência e discriminação”, enfatiza
Municípios mais afetados
Além de Manaus, outras cidades do interior do estado também registraram altos índices de homicídios. Entre os municípios mais visados pela rota do tráfico, sendo disputado pelas facções criminosas locais e internacionais, destacam-se:
- Manacapuru: município que fica a cerca de 100 quilômetros a capital, viu um aumento de 18% nos homicídios. Com 52,1 homicídios por 100 mil habitantes. Deste modo, a violência em Manacapuru está fortemente ligada ao tráfico de drogas e à disputa por territórios entre facções.
- Itacoatiara: Outro município que apresenta um índice elevado de homicídios, com 49,7 por 100 mil habitantes. Itacoatiara é um ponto estratégico para o escoamento de drogas e armas, tornando-se um local de frequentes confrontos entre grupos criminosos.
- Tefé: Registrou um aumento de 22% nos crimes, alcançando a taxa de 46,8 por 100 mil habitantes. A cidade é considerada um ponto de transbordo para drogas vindas da fronteira com o Peru e a Colômbia, intensificando a violência na região.
Facções criminosas e o Norte violento
A presença de facções criminosas no Amazonas é um dos principais fatores que fazem a região ser uma das mais violentas do Norte do Brasil, de acordo com o Atlas. Alguns grupos criminosos estão em constante disputa pelo controle do tráfico de drogas e de outras atividades ilícitas. Essa rivalidade resulta em frequentes confrontos armados, não só nas grandes cidades, mas também nos municípios menores.
“Vários estados do Norte do país, por estarem sujeitos à atuação intensa de pelo menos dez organizações criminosas internacionais com atuação em regiões de fronteira […] e por possuírem quantitativo populacional menor, possuem maiores variâncias nas taxas de homicídio ao longo do tempo, uma vez que contendas locais ligadas ao narcotráfico já são suficientes para impulsionar substancialmente os indicadores, como é o caso do Amapá e do Amazonas”, descreve o documento.
A fragilidade das fronteiras amazônicas facilita a entrada de armas e drogas, potencializando os conflitos. “A violência no Amazonas está intrinsecamente ligada à dinâmica do tráfico de drogas. A região é estratégica para o escoamento de entorpecentes, o que torna as disputas territoriais particularmente intensas”, explica Ana Paula Mendes, socióloga e pesquisadora do Ipea.
Impacto social e econômico
O aumento dos homicídios não afeta apenas a segurança dos cidadãos, mas também gera impactos profundos na sociedade e na economia local. O clima de medo e insegurança inibe investimentos e prejudica o desenvolvimento econômico, afastando turistas e empresas. “A violência tem um efeito cascata que atinge diversas esferas da vida social. Desde a perda de capital humano até a retração econômica, os prejuízos são incalculáveis”, comenta o economista Roberto Silva.