Letícia Rolim – Rios de Notícias
MANAUS (AM) – O aumento de automóveis (veículos de quatro rodas) e motocicletas em Manaus tem gerado impactos significativos na mobilidade urbana. A crescente aquisição de veículos pela população, motivada pelas fragilidades do sistema de transporte coletivo, compromete ainda mais a circulação pela cidade.
De acordo com dados do Instituto Municipal de Mobilidade Urbana (IMMU), a capital amazonense possui atualmente 960.830 veículos, quase um milhão. Desse total, mais de 540 mil são automóveis de quatro rodas e as motocicletas representam mais de 280 mil.
O Portal RIOS DE NOTÍCIAS conversou com o especialista em transporte e trânsito e ex-titular do IMMU, Manoel Paiva, sobre o aumento do número de veículos nas ruas de Manaus e os problemas decorrentes.
“Na realidade, o transporte coletivo urbano é ruim, não é atrativo e efetivo. As pessoas não tem nenhum motivo pra largar o transporte individual e voltar a utilizar o transporte coletivo”, ressalto o especialista.
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Em uma análise aos números, Paiva ressalta que dentre os mais de 900 mil veículos, desses, cerca de 60% são veículos particulares de quatro rodas. Outra parcela é do transporte individual, que são as motocicletas, atualmente, elas representam 32% dessa frota. O que, somando resulta em torno de 93% da frota que circula na cidade de Manaus.
Manoel destaca que, considerando a região metropolitana, há mais de um 1.150.000 (um milhão cento e cinquenta mil) veículos.
“Isso significa que a maioria da população se desloca por meio do transporte individual”, destaca o especialista.
Transporte coletivo
De acordo com dados do Instituto Municipal de Mobilidade Urbana (IMMU), a capital conta com aproximadamente 1.216 veículos distribuídos em 218 linhas que atendem todas as áreas da cidade, incluindo a zona rural.
Apesar desse número, o transporte coletivo em Manaus, que engloba o transporte urbano convencional, alternativo, executivo e os ônibus utilizados no polo industrial, representa apenas 1,5% da frota circulante, conforme aponta Manoel Paiva.
“É um dado assustador, porque esses ônibus são responsáveis por transportar quase 70% da população de Manaus. Entre trabalhadores do distrito, usuários do transporte urbano convencional e seletivos, o transporte coletivo atende uma grande maioria de maneira não confiável, desconfortável e insegura. Há uma distorção: a minoria é transportada pela maior frota enquanto a maioria da população é transportada de maneira precária”, observa Paiva.
Os dados do IMMU revelam que o sistema de transporte da capital registra mais de 500 mil passagens diárias. Apesar da aquisição de novos ônibus este ano, o sistema de transporte público ainda não supre às necessidades da população.
A demora na espera dos ônibus, os riscos de assaltos e a superlotação são alguns dos motivos que levam a população a optar pela compra de veículos próprios, embora isso não resolva os problemas de trânsito em Manaus nos horários de pico.
“Hoje o nosso sistema viário é utilizado basicamente pelo transporte individual. Não há uma operação segregada, exclusiva para o transporte urbano convencional. É por isso que ele é demorado, é por isso que a velocidade média é de 12 quilômetros por hora, quando deveria ser, no mínimo, de 25 a 30 quilômetros por hora. Isso permitiria mais viagens, menos tempo de espera nas paradas e um percurso mais rápido, resultando em mais conforto e confiabilidade”, destaca Paiva.
Melhorias
Para Manoel Paiva, a atual estrutura de mobilidade urbana enfrenta sérios desafios, e não há iniciativas para quebrar o ciclo de uso massivo de automóveis. Ele destaca a falta de incentivos atraentes que possam convencer os novos trabalhadores a optarem pelo transporte coletivo em vez do transporte individual.
Problemáticas como a falta de prioridade na operação, na melhoria da qualidade do transporte coletivo urbano. Para Manoel, a medida que essas questões forem melhoradas, vai ser possível “resgatar o passageiro que fugiu, e atrair novos usuários, fazendo com que as pessoas possam deixar o seu carro em casa” com mais eficiência e menos riscos.
“Mesmo após a pandemia, o sistema de transporte urbano convencional ainda sofre com uma redução de passageiros. Desde o início da pandemia, observamos uma diminuição de aproximadamente 30% no número de passageiros. O que foi feito para reverter essa tendência e trazer esses passageiros de volta? Precisamos oferecer atrativos que incentivem os novos usuários, que estão entrando no mercado de trabalho, a escolherem o transporte coletivo urbano em vez do individual”, observa Paiva.
O cenário atual em Manaus evidencia a necessidade de investimentos para melhorar a qualidade do transporte coletivo. Neste quesito, Paiva enfatiza que, para alcançar melhorias, é essencial equilibrar a demanda e oferecer um serviço mais eficiente e seguro à população.
Mobilidade ativa
Além dos problemas já citados pelo especialista em transporte e trânsito, Manoel Paiva, outra questão que agrava o trânsito em Manaus é a falta de incentivo para alternativas de transporte como caminhada e ciclismo. Segundo Paiva, essas opções poderiam aliviar o tráfego, mas não são utilizadas devido à ausência de uma infraestrutura que priorize a mobilidade ativa.
“A mobilidade ativa deveria permitir que as pessoas andassem a pé com mais segurança. No entanto, essa infraestrutura é escassa, inacessível e não inclusiva. As calçadas de Manaus não oferecem condições de segurança, conforto e tranquilidade para os pedestres, seja no centro da cidade, na zona Centro-Sul ou nos bairros mais afastados”, destaca Paiva.
Devido à precariedade da infraestrutura urbana, muitos optam por se deslocar com seus próprios veículos, aumentando ainda mais o congestionamento. Esse problema também afeta os ciclistas, que enfrentam riscos ao utilizarem as vias públicas.
“Para que as pessoas pudessem optar por um transporte mais sustentável, melhor para o meio ambiente e para a saúde, seria necessário oferecer ciclovias seguras. Atualmente, só temos faixas pintadas na pista, que não proporcionam segurança, conforto ou confiabilidade para os ciclistas”, observa o engenheiro.
No ponto de vista do especialista, Manaus tornou-se uma cidade dependente dos automóveis devido à falta de alternativas viáveis. Ele defende a necessidade de uma intervenção para melhorar a segurança viária e o transporte público.
“Precisamos de um choque de melhoria na segurança viária e no transporte público. É fundamental trabalhar no sistema de transporte para que as pessoas optem por não usar o automóvel”, afirma Paiva.
O especialista ressalta que a melhoria da mobilidade urbana em Manaus é uma necessidade urgente. “É essencial melhorar o trânsito em Manaus, a circulação de veículos, o transporte coletivo e a mobilidade das pessoas”, finaliza Paiva.
Relato
Os impactos da ineficiência dos transportes públicos e do crescente aumento de veículos na cidade também é sentido pela estudante de marketing, Lunna Reis, que utiliza os coletivos diariamente para trabalhar e estudar.
“Todos os dias é a mesma novela, dependo dos ônibus para ir trabalhar pela manhã e ir para a faculdade a noite. Temos que lidar com a demora na espera dos coletivos, e quando passa, é daquele jeito, uma ‘lata de sardinha’. Além disso, ainda corremos o risco de ser assaltados, pois não há segurança. Quando saio da aula, preciso esperar aproximadamente 1h30 para conseguir pegar o ônibus que vai para o meu bairro”, desabafou Lunna.
A estudante destaca que se pudesse, também adquiriria um veículo próprio pois economizaria tempo, e seria mais seguro e confortável.
“É cansativo usar o transporte público. A motocicleta tem a questão da segurança, mas é mais prática e rápida para sair do engarrafamento. Se eu pudesse compraria um carro, não dá pra fugir do trânsito em horários de pico, mas não perderia mais tempo aguardando o ônibus, seria mais confortável e um pouco mais seguro também e ainda chegaria mais cedo em casa.”, relatou Reis.