Gabriela Brasil – Rios de Notícias
MANAUS (AM) – Com o desenvolvimento da tecnologia e da internet, também surgiram novas práticas ilícitas de conseguir benefícios a partir de fraudes ou golpe nos meios digitais. Os números de estelionato na internet, praticados no Amazonas, no primeiro semestre de 2023 já superaram os crimes contabilizados em todo o ano de 2022.
Casos como dos influenciadores amazonenses Lucas ‘Picolé’ e Isabelly Aurora que foram presos neste mês pela venda de rifas fraudulentas na internet e do falso corretor de imóveis, Leonardo Rick, que anunciava casas e apartamentos em Manaus nas redes sociais sem anuência dos proprietários, são alguns dos exemplos de crime de estelionato na internet.
O primeiro semestre de 2023, no Amazonas, superou os 12 meses de 2022 em casos de estelionato na internet. Conforme os registros da Delegacia Especializada em Repressão aos Crimes Cibernéticos (DERCC), da Polícia Civil do Amazonas, foram contabilizados, de janeiro a junho de 2023, cerca de 225 casos.
O número é maior que o registro de casos de estelionato na internet do ano inteiro de 2022, quando o total de crimes chegou a 172. Em comparação com os seis primeiros meses de 2022, o aumento do número de estelionatos na internet no primeiro semestre de 2023 é ainda maior: de 192%.
“O crime estelionato virtual, fraude ou golpe na internet são aqueles tipos de golpes que o golpista utiliza e-mails ou link maliciosos, e também se passa por empresas conceituadas querendo aplicar golpes para obter vantagens financeiras por meios eletrônicos. Pode se utilizar tanto pela internet como também por aparelho celular”
Antônio Rondon, delegado
De acordo o titular da DERCC, Antônio Rondon, um dos crimes de estelionato na internet mais comuns em Manaus é o perfil fake do Whatsapp. Neste caso, o golpista se passa geralmente por um familiar ou uma empresa que apresenta propostas atrativas, como vagas de emprego.
“Então, o golpista pede dados pessoais destas pessoas [vítimas], e no apagar das luzes pede o pix. Quando ele se passa por familiares, ele diz que está passando alguma necessidade, e a vítima equivocadamente acha que está conversando com o seu familiar, aí acaba enviando o pix”
Antônio Rondon, delegado
Vítimas
O estudante de enfermagem Lucas Cardozo, de 22 anos, faz parte do grupo de vítimas de estelionato digital no Amazonas. Em junho de 2023, o estudante planejava comprar um presente para a companheira, durante o período do Dia dos Namorados.
Entre as pesquisas de presentes na internet, Lucas encontrou a propaganda de um colar no Facebook. O item aparecia em promoção, o que atraiu a atenção do estudante.
“Entrei no site e parecia tudo ok. Olhei os comentários para ler os relatos de outras pessoas e as compras que fizeram na loja. Depois de olhar tudo, eu confiei e fiz o pagamento. Fui atrás da loja, e eles me mandaram a confirmação [da compra] no meu e-mail e disseram que meu pedido ia chegar”
Lucas Cardozo, estudante
No entanto, poucas horas depois, Lucas entrou novamente no e-mail e percebeu que a foto da empresa havia sumido. Também tentou entrar no site da loja, mas ela foi excluída. Por último, ele mandou mensagem por e-mail para a empresa, mas não obteve retorno.
“Quando descobri [o golpe] fiquei desnorteado, mas acabei deixando para lá. Já tinha se passado um tempo depois da compra, então não tinha muito o que fazer”, afirmou Cardozo.
A estudante Taynara Farias, de 21 anos, também foi atraída por anúncios nas redes sociais e acabou sendo vítima de estelionato virtual. Na época, em 2021, ela precisava de um celular novo, até que viu uma propaganda no Instagram com um preço chamativo.
“Foi quando entrei em contato com a loja para falar sobre o celular. A gente fechou negócio e fiz o pagamento para eles. Falaram que assim que colocassem no correio iam me dá o rastreamento para acompanhar”
Taynara Farias, estudante
Após a compra, a estudante esperou dias pela confirmação, mas não teve resposta. “Foi quando percebi que eles tinham me enganado”.
“Demorou dias a enrolação e [os proprietários da loja] me bloquearam de todas as redes sociais. Procurei meu banco para denunciar a compra. Eles disseram que não iam poder estornar o dinheiro, mas bloquearam a conta deles e logo em seguida o Instagram deles também caiu”, contou Farias.
Expansão do estelionato e subnotificação
Ao portal RIOS DE NOTÍCIAS, o titular da DERCC, Antônio Rondon, destacou que a internet se tornou um espaço popular, onde todos usam. Neste sentido, relações comerciais acabam sendo amplamente difundidas no espaço digital. É neste contexto que muitos se aproveitam para cometer estelionato.
“A gente percebe que os primeiros seis meses de 2023 já tem um número superior a todo o ano de 2022 sobre este crime de estelionato na internet. Então, é a prova inequívoca de que de fato o crime vem aumentando neste terreno que está sendo cada vez mais utilizado por pessoas de diversas faixa-etárias”
Antônio Rondon, delegado
Dados da DERCC também apontam que o mês de maio de 2023 bateu recorde de crimes de estelionato na internet desde 2021, com 61 casos. O mês superou junho de 2023, com 52 e julho de 2021, com 46 casos.
De acordo com o delegado Antônio Rondon, houve uma queda nos casos de estelionato de 2021, com 284 vítimas, para 2022, com 172.
Isso porque, houve uma mudança na DERCC entre 2021 e 2022, quando ela deixou de ser um espaço para registro de boletins para de fato se tornar Delegacia da Polícia Civil. Para Rondon, durante esta transição, houve uma subnotificação dos casos, e por consequência, o baixo registro de estelionatos na internet.
“Não é que tenha deixado de acontecer o crime. Já de 2022 para 2023 mostra o que de fato vem acontecendo atualmente”, disse o delegado.
Legislação
Conforme o advogado e presidente da Comissão de Direito Digital, Startups e Inovação da OAB-AM, Aldo Evangelista, o crime estelionato, originalmente previsto no artigo 171, passou a ser relacionado com espaço virtual com a lei 14.155, criada em 2021. Ela adicionou no segundo parágrafo do crime de estelionato a chamada “fraude eletrônica”. O termo é usado no direito para se referir aos crimes de estelionato no espaço digital.
“Ele é popularmente chamado de ‘estelionato na internet’, mas esse termo na verdade não está escrito expressamente no código penal”
Aldo Evangelista, advogado
A pena em casos de fraude eletrônica pode chegar a 8 anos de prisão. Ela pode ser aumentada se o equipamento computacional foi utilizado fora do território nacional. De acordo com Aldo Evangelista, é importante que a vítima procure um advogado para buscar a melhor orientação.
“Vem também a especialidade da perícia digital forense. Quando estamos conectados todos os dispositivos informáticos geram o IP. Por ele, tem como localizar o local da máquina em qualquer lugar do Brasil e do mundo, da onde houve essa conexão e onde surgiu aquela mensagem ou texto”
Aldo Evangelista, advogado
O especialista também ressaltou a necessidade da vítima registrar um boletim de ocorrência. Em alguns casos, é possível entrar com uma ação cível e buscar reparação de danos materiais e morais.
Cuidados
O advogado aconselha dois passos importantes para evitar esse tipo de crime: constante desconfiança e prevenção. “Uma prevenção técnica é você utilizar softwares originais e antivírus atualizados, e VPN. Ter cuidado quando você utilizar o dispositivo informático em alguma conexão pública”.
Ele também alertou para o cuidado com os links. Mesmo que o link apresente uma mensagem atrativa, seja no e-mail ou em outras redes sociais, é importante não acreditar de imediato nas promessas e vantagens. “Sempre desconfiar daquele com quem você está falando”.
Nos casos de golpe via pix, a vítima deve entrar em contato com o banco ou o banco central. “Dependendo de alguns casos, pode ligar para as operadoras de telefone celular para explicar que algo aconteceu com o telefone”, disse Evangelista.
Já o delegado-titular da DERCC, Antônio Rondon, chama atenção em casos onde o produto oferecido na internet possui um preço muito abaixo do mercado. Nestes casos, há grandes chances de ser golpe.
“Quando a oferta é irrecusável, a pessoa tem que acender a sua atenção. Normalmente a compra pela internet pressupõe um pagamento antecipado antes de receber o bem. Então, a pessoa tem que ter absoluta certeza de que está tratando com uma pessoa de confiança ou uma empresa conceituada”
Antônio Rondon, delegado