Júlio Gadelha – Rios de Notícias
MANAUS (AM) – Após a desistência do presidente americano Joe Biden, de 81 anos, de concorrer à reeleição neste domingo, 21/7, o democrata cedeu a pressões de colegas e líderes do partido, que defendem um nome mais forte na corrida deste ano à Casa Branca.
O mundo se pergunta se essa desistência facilita ou atrapalha o adversário republicano Donald Trump, de 78 anos. O ex-presidente está em alta após sobreviver a uma tentativa de assassinato e depois de Biden demonstrar fragilidades físicas e confusões mentais.
Essa mudança na política americana também levanta questionamentos sobre a política externa e como pode afetar as relações com o Brasil. Para esclarecer essas questões, o Portal RIOS DE NOTÍCIAS conversou com cientistas políticos e historiadores para entender o cenário geopolítico das eleições americanas.
Desistência fortalece Trump?
Na visão de Bruno Soller, estrategista eleitoral especializado em pesquisas de opinião pública e graduado em Relações Internacionais pela PUC-SP, “Trump, depois do atentado, saiu fortalecido e, até por uma lógica que ultrapassa a política e entra na fé (como um ungido por ter escapado do atentado), surge como favorito.”
Mas ele explica que “A decisão de Biden ajuda a aglutinar um pouco os democratas. Havia um racha muito grande no partido, de alas que queriam a retirada de sua candidatura.” Soller acredita, então, que essa desistência, que ele considera “cheia de simbologias”, no final das contas, é ruim para os republicanos de Donald Trump.
Na mesma linha, Ygor Olinto Rocha Cavalcante, Historiador e Psicanalista, professor do Instituto Federal do Amazonas (IFAM) e Doutorando em História Social pela UFAM acredita que “não fortalece Trump” e que “Agora, trata-se de uma nova eleição, um novo jogo. A possibilidade de uma mulher negra tornar-se a candidata (Vice-presidente Kamala Harris), como deve ser o caso, coloca a disputa em outros termos e creio que até mais convocatórios ao engajamento do campo democrático.”
Relação Brasil e EUA
Sobre o tema, o cientista político e advogado Helso Ribeiro, presidente da Comissão de Relações Internacionais da OAB/AM, afirma que não haverá mudanças significativas, exceto em questões ideológicas. Helso pontua que “as instituições americanas são extremamente fortes, e uma democracia consolidada acaba inviabilizando mudanças drásticas.” Ele destaca que a “política externa entre os países sempre foi de laços muito fortes: os Estados Unidos são um grande parceiro comercial do Brasil e vice-versa” e ressalta que o presidente Lula declarou nesta semana que, independentemente de qual presidente ganhe, buscará manter as melhores relações diplomáticas.
Já Bruno Soller considera que a questão migratória e de moradia para brasileiros nos EUA deve passar por mudanças. “A mudança principal deve ser em relação às políticas migratórias. Muitos brasileiros vivem nos EUA ilegalmente. Trump promete fazer um combate mais firme a esses imigrantes. Nisso, podemos ter maiores dificuldades com uma vitória republicana.”
Em análise econômica, Soller comenta que “as relações não devem sofrer grandes alterações. Os democratas costumam até ser mais protecionistas na economia, o que gera mais dificuldades para os produtos brasileiros. Mas, na atual fase das relações econômicas, eu diria que ambos atendem ao que o Brasil precisa.”
Crescimento da direita
Na análise de Soller, “O crescimento da direita se dá principalmente por questões afirmativas. O nacionalismo, a reação às mudanças vistas na sociedade que afetam o status quo religioso (como as pautas identitárias) e problemas econômicos.” Ele comenta que “nos EUA, a maior mudança não foi um crescimento da direita, mas sim um crescimento da esquerda progressista, que gerou um contraponto mais radical à direita, iniciado pelo Tea Party Republicano.”
O historiador Ygor vê o crescimento da direita como um resultado direto das falhas da própria democracia liberal e argumenta que “os governos de esquerda têm fracassado na tarefa de oferecer saídas. Para aqueles que se colocam nesse campo, é urgente olhar para essas falhas e fazer surgir algo novo a partir daí.”
Para o cientista político Helso Ribeiro, o crescimento da direita é “fruto de uma visão que está sendo desenvolvida contra estrangeiros.” Helso explica que vê um crescimento se desenvolvendo dentro de um “binômio de emprego e a questão da migração mundo afora, algo que afeta bastante os países desenvolvidos,” criando um sentimento de nacionalismo exacerbado.
Trump risco para democracia?
Bruno Soller, estrategista eleitoral, não acredita que a vitória de Donald Trump represente um risco à democracia americana. Segundo ele, “a democracia é um bem dos Estados Unidos. Trump já foi presidente, perdeu e as instituições garantiram a continuidade da ordem e da democracia. Os EUA já passaram por atentados que vitimaram presidentes, processos de impeachment e outras tantas coisas, mas mesmo assim, tudo seguiu adiante. A volta de Trump seria só mais uma página nesse imenso livro.”
Helso Ribeiro compartilha uma visão semelhante. Ele afirma: “Eu não vejo na vitória de Donald Trump um risco à democracia. Eu lastimei quando ele perdeu as eleições, aquele tumulto que fizeram, e estão pagando, estão respondendo por isso, aquilo que fizeram, invadindo o Capitólio. Eu achei lastimável o ex-presidente Trump não ter passado a faixa para Joseph Biden. Mas eu diria que é algo pontual, tá? Então, eu não vejo a vitória de Donald Trump, um megaempresário com uma visão de liberalismo mais forte, como uma ameaça à democracia. Caso ele vença, a gente está tratando de especulações. Com um viés forte de relações de integração, os Estados Unidos é o país que mais tem relações mundo afora e ele vai permanecer com isso, que é interessante para os Estados Unidos.”
Ambos os especialistas ressaltam a resiliência das instituições americanas e acreditam que, mesmo com o retorno de Trump, a democracia nos Estados Unidos permanecerá robusta e funcional.