Redação Rios
BRASÍLIA (DF) – “Até que enfim vão parar os sons de bombas”. A declaração de Karla Araújo Cardoso na chegada à Base Aérea de São Paulo, em Guarulhos, resume a sensação de alívio dela e de outros 2.662 passageiros resgatados da zona de conflito no Oriente Médio pelo Governo Federal. Em 13 voos entre Beirute, no Líbano, e o Brasil, a Raízes do Cedro se consolidou como a maior operação de repatriação de brasileiros e familiares da história do país.
Os critérios de prioridade levaram em conta brasileiros não residentes, depois os residentes e categorias estabelecidas por lei: idosos, mulheres, gestantes, crianças e pessoas com deficiência. No grupo de resgatados desde 2 de outubro, vieram 1.198 mulheres (15 gestantes), 645 crianças de até 12 anos, 247 pessoas com deficiência, 290 idosos, além de 34 animais domésticos.
Leia Também: Anistia Internacional classifica ação de Israel em Gaza como genocídio
Segundo informações do Ministério das Relações Exteriores, além de 1.991 brasileiros, vieram nas aeronaves da Força Aérea Brasileira familiares de outras 13 nacionalidades: libaneses, sírios, paraguaios, argentinos, uruguaios, holandeses, venezuelanos, chilenos, colombianos, palestinos, franceses, peruanos e jordanianos.
“Espero que vocês encontrem no Brasil a felicidade que tiraram de vocês com esse bombardeio. E que possam reconstruir a vida em paz”, afirmou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na chegada do primeiro voo a Guarulhos, em 6 de outubro. “A guerra só destrói. Quando não perde a vida, perde escola, hospital, médico, uma série de coisas que trazem tranquilidade para a gente. O que constrói é a paz”, completou o presidente.
Ao todo, 4.064 pessoas foram alcançadas durante as articulações da operação via Ministério das Relações Exteriores, em especial a partir do trabalho Embaixada do Brasil em Beirute, no Líbano. Além das 2.663 que confirmaram presença e retornaram ao Brasil, houve 346 não comparecimentos ao aeroporto e 1.056 desistências do processo, muitos porque conseguiram meios particulares de voltar ao país ou de se deslocar para outras regiões.
“É uma operação de grande vulto. Maior do que foi a operação na Palestina, na Faixa de Gaza, em Israel no ano passado, quando 1.560 pessoas, aproximadamente, foram resgatadas”, ressaltou o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, em entrevista ao Bom Dia, Ministro.
A ação do Governo Federal exigiu intensa costura. Envolveu, além da atuação direta de servidores do Itamaraty na identificação, formalização e conferência de listas e facilitação de documentação para os resgates, o emprego de aeronaves e efetivo da Força Aérea Brasileira. Na chegada ao Brasil, uma força-tarefa de suporte com integrantes dos ministérios da Saúde, da Justiça e Segurança Pública, do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), além de entidades da sociedade civil.
Em mais de 300 horas de voo, a Força Aérea Brasileira empregou 48 profissionais de saúde, entre 16 médicos, 15 psicólogos e 16 enfermeiros para garantir os atendimentos necessários ao longo dos voos de resgate. “A gente dá um apoio à tripulação e aos passageiros, para mitigar efeitos desse estresse, de tudo aquilo que causa nas pessoas lidar com situações como essa”, disse a tenente Ingrid, psicóloga. Os voos para o Líbano também levaram 27,3 toneladas de medicamentos e insumos hospitalares e 62,5 toneladas de alimentos. Foram empregadas duas aeronaves. Em 12 dos 13 voos de resgate, o KC-30. Em uma delas, o KC-390 Millennium.
Saúde
A Força Nacional do SUS realizou mais de 2,4 mil atendimentos a repatriados do Líbano. A equipe composta por 169 profissionais, incluindo médicos, enfermeiros, tradutores e psicólogos, promoveu 1.815 atendimentos psicossociais e 627 assistenciais. No desembarque, informações sobre as condições físicas e emocionais dos passageiros eram compartilhadas por profissionais da Força Aérea Brasileira (FAB), permitindo um atendimento rápido e direcionado. Casos mais comuns incluíram desidratação leve, picos hipertensivos e atendimentos psicológicos iniciais.
O time atuava com tendas para primeiros socorros, além de espaços como brinquedoteca e áreas de oração, respeitando aspectos culturais e religiosos dos repatriados. As equipes incluíam homens e mulheres, além de profissionais que dominavam árabe, francês, inglês e português. “Um acolhimento humanizado requer respeito à cultura e particularidades de cada pessoa, pilares do SUS, como equidade e integralidade”, afirmou Amanda Dantas, coordenadora da missão.
Para Rabiha Taha, uma das repatriadas, o atendimento foi acolhedor e trouxe segurança. “Eu andava com o coração na mão no Líbano. Medo e bomba para todo lado. Fiquei com a família dividida, mas precisava trazer minha mãe para junto dos meus irmãos. Recebi um atendimento respeitoso, carinhoso e acolhedor. Foi um alívio retornar”, declarou.
Acolhimento
Na chegada a Guarulhos, a recepção por equipes multidisciplinares oferecia acolhimento humanitário e assistência integral. Integrantes do MDS identificavam casos de vulnerabilidade e, em parceria com a Agência da ONU para Migrações (OIM), foi formada uma equipe de assistência. O MDS disponibilizou acomodação temporária, hospedagem e alimentação. No total, 856 pessoas foram acolhidas temporariamente em rede hoteleira, com investimento aproximado de R$ 193 mil. Além disso, o MDS recebeu apoio da Latam na emissão de 83 passagens aéreas e a sociedade civil apoiou com a emissão de 92 passagens, via ônibus, para diversos municípios brasileiros.
Em articulação com a Secretaria de Desenvolvimento Social de São Paulo (SEDS-SP), Secretaria de Desenvolvimento do Espírito Santo (SEDES) e Comitê Especial de Atenção aos Repatriados e Migrantes do Líbano de Foz do Iguaçu (PR), houve apoio para acolhimento institucional de famílias que não tinham vínculos familiares e/ou não condições próprias. Além disso, o Governo do Paraná arcou com 106 passagens para municípios do estado.
“Do quantitativo total dessas pessoas atendidas pela assistência social, 56% já foram integradas junto às famílias e amigos. Também fazemos um contato posterior para verificar se está tudo bem. Outros 32% foram acolhidos emergencialmente em hotéis providenciados pelo ministério, até que tivessem condições de seguirem o seu fluxo de proteção no Brasil”, explicou Regis Spíndola, diretor de Proteção Social Especial do MDS.
*Com informações da Agência Brasil