Redação Rios
SÃO PAULO (SP) – Senor Abravanel, mais conhecido como Silvio Santos, um dos maiores nomes da história da TV brasileira, morreu neste sábado, aos 93 anos de idade. A informação foi confirmada pelo SBT no X (antigo Twitter). Apresentador e empresário, foi o fundador do SBT, emissora em que trabalhou ao longo das últimas quatro décadas, e também de diversas empresas do Grupo Silvio Santos, como o Baú da Felicidade.
Ao longo das décadas, passou pelas principais emissoras de TV, como Tupi, Globo, Record e, o próprio SBT (anteriormente TVS). Fez parte do cotidiano dos brasileiros em diversos programas de auditório, como nos infindáveis quadros do Programa Silvio Santos, as perguntas e respostas do Show do Milhão, a junção de casais no Em Nome do Amor, a ‘vida real’ dos famosos do reality A Casa dos Artistas, a realização de sonhos na Porta da Esperança ou a ajuda financeira no Topa Tudo Por Dinheiro e no Roda a Roda, entre tantos outros.
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É raro encontrar quem jamais tenha ouvido algum de seus bordões, como “Má ôe!”, “Quem quer dinheiro?”, “É namoro ou amizade?”, “Você está certo disso?”, ou a letra de músicas como Ritmo de Festa ou Silvio Santos Vem Aí! (Olê, olê, olá!).
No fim dos anos 1980, chegou a anunciar planos para se afastar da TV, elegendo Gugu Liberato como substituto. A ideia, porém, não foi à frente, e manteve-se em atividade por mais algumas décadas. Na mesma época, também explicitou pretensões políticas, com planos por um cargo executivo nas eleições.
A tentativa mais famosa e que mais se aproximou de ocorrer foi na disputa presidencial de 1989, quando chegou a fazer uma breve e atabalhoada campanha pelo Partido Municipalista Brasileiro, no lugar de Armando Corrêa, cujo nome já estava impresso nas cédulas. Silvio liderou pesquisas de intenção de voto contra Collor e Lula. O TSE, porém, indeferiu a candidatura antes do pleito.
Silvio Santos foi casado com Maria Aparecida Vieira Abravanel, a Cidinha, que morreu de câncer quando ainda era jovem. Posteriormente, teve um segundo casamento com Íris Abravanel. Dos relacionamentos, vieram suas seis filhas: Cintia, Silvia, Daniela, Patrícia, Rebeca e Renata. À exceção de Daniela, que usa o sobrenome Beyruti, todas são conhecidas pelo sobrenome do pai, Abravanel.
Alguns dos principais problemas de saúde começaram a surgir quando já tinha mais de 60 anos de idade, como no joelho, coração e próstata. Na década de 1980, foi aos Estados Unidos para uma cirurgia e tratamento na garganta, e posteriormente precisou se curar de um tumor na região da pálpebra de seu olho. Ao longo da vida, também apresentou uma conhecida alergia a perfumes.
Relembre abaixo a trajetória e o legado de Silvio Santos até se tornar o principal apresentador de televisão do Brasil.
Início como camelô
Silvio Santos nasceu no Rio de Janeiro, então capital do Brasil, como Senor Abravanel, em 12 de dezembro de 1930, filho do grego Alberto Abravanel e sua mulher, Rebeca Caro. Ele teve cinco irmãos: Henrique, Leon, Beatriz, Perla e Sara.
O apresentador puxou o lado vendedor de seu pai que, ainda jovem, fugiu da região de Salônica para não servir ao exército, se tornando jornaleiro em Atenas. Na sequência, foi para Marselha, na França, vender pistache e amendoim na rua, o que era proibido. Preso e expulso do país, foi de navio para o Rio de Janeiro, onde trabalhou no porto como intérprete e guia de turistas para juntar dinheiro e abrir uma loja.
Em 1945, ainda adolescente, Silvio despertou para o caminho dos negócios quando se deparou com um homem vendendo capas de plástico para títulos de eleitor na avenida Rio Branco. Seguiu-o para saber onde ficava seu fornecedor, entrou na loja e comprou uma delas por dois cruzeiros. Levou-a para a rua e ofereceu a quem passava, afirmando ser a última. Com o dinheiro da primeira venda, comprou mais duas e revendeu-as, novamente com o discurso de que era a última – ainda que houvesse outra – e assim por diante.
Na sequência, foi diversificando os negócios. Aprendeu a fazer alguns truques com moedas e baralhos para chamar a atenção, e passou a vender dezenas de canetas diariamente. À época, contava com a ajuda de amigos, tanto para fazer o papel de ‘comprador’ interessado, quanto para avisá-lo da chegada da fiscalização.
Foi numa das vezes em que foi pego pelo ‘rapa’ que Silvio encontrou sua primeira oportunidade com a comunicação. Na ocasião, o diretor de fiscalização da prefeitura à época pretendia puni-lo. “Quando ele viu que eu tinha pouca idade, falava regularmente e era estudante, modificou seu pensamento a meu respeito. Em vez de me levar para o juizado de menores, me deu um cartão para que eu fosse procurar um amigo dele na rádio Guanabara, Jorge de Matos”, relatou o apresentador na biografia A Fantástica História de Silvio Santos, escrita por seu assessor, Arlindo Silva.
Ao chegar à emissora, descobriu um concurso de locutores e decidiu se inscrever. Foi o campeão e ganhou uma vaga com salário de 1,3 mil cruzeiros mensais, muito menor que os mais de 900 cruzeiros diários que conquistava como camelô. Um mês após a contratação, se demitiu e voltou a vender suas mercadorias pelas ruas.
Surge Silvio Santos
Inspirado em grandes nomes da rádio na época, como César de Alencar, Heber de Boscoli, Osvaldo Luiz e Manoel Barcelos, tinha o costume de frequentar os auditórios durante as gravações, e foi justamente numa dessas ocasiões que surgiu o nome Silvio Santos.
“Minha mãe costumava chamar-me de Silvio, em vez de Senor. Um dia, quando fui entrar no programa de calouros do Jorge Cury, o Mario Ramos, produtor, perguntou o meu nome. ‘Silvio’, respondi. ‘Silvio de quê?’. Eu disse: ‘Silvio Santos – porque os santos ajudam’. Foi um estalo que me deu, uma coisa do momento, que pegou. Também foi uma maneira de disfarçar, porque meu nome, Senor Abravanel, já estava muito ‘manjado’ nos programas de calouros, pois eu sempre ganhava alguma coisa“, explicava.
Exército, rádio e novos desafios
Aos 18 anos, o jovem se alistou no exército, fazendo a escola de paraquedistas, obrigando-o a se afastar das atividades como camelô. Voltou para a rádio, no programa de Silveira Lima, na Mauá, posteriormente migrando para a Tupi. Inclusive, foram em algumas figurações na TV Tupi que suas primeiras aparições televisivas.
Silvio Santos ainda trabalhou nas noites da rádio Continental, em Niterói, antes de pedir demissão e mudar de área. Ao Estadão, em 1983, relatava que a ideia surgiu quando pegava a última barca do dia para voltar para casa, já depois da meia-noite: “Era muito monótona. Só viajavam três ou quatro homens e o resto era tudo prostituta, fugindo para Niterói porque eram reprimidas pela polícia do Rio. Aí eu pensei: por que não botar música? Pelo menos fica um ambiente mais alegre”.
O apresentador firmou um acordo com uma loja de eletrodomésticos com a intenção de criar um serviço de anúncios em alto-falante nas barcas da Cantareira. Em troca do aparelho, faria propaganda gratuita à casa ao longo de um ano. Silvio investiu em um bar para venda de bebidas e cartelas de bingo para os usuários da barca. Nessa época, considerava que havia deixado a vida de camelô definitivamente para trás.
Pouco depois, voltou à rádio, desta vez na Nacional. Contatou Costa Lima e fez um teste para locutor, assinando contrato no valor de 5 mil cruzeiros ao mês em 1954, mesma época em que teve o primeiro contato com Manoel de Nóbrega, de quem se tornaria amigo. Com dívidas, continuava a trabalhar no bar, sem conseguir a quantia que precisava. Foi então que teve a ideia de criar uma publicação, a revistinha Brincadeiras para Você, que trazia passatempos como palavras cruzadas, charadas e piadas. Silvio passou a vender exemplares para lojas, que as distribuíam de graça aos clientes.
O locutor passou a trabalhar também em circos, fazendo a apresentação de artistas. Quando ocorriam atrasos, buscava entreter a plateia, tendo suas primeiras experiências como animador de auditório, o que faria muitas vezes dali em diante. O apresentador, porém, ficava envergonhado em algumas ocasiões, e seu rosto avermelhado acabou lhe rendendo o apelido de ‘Peru que fala’. Aproveitando este lado de Silvio, Nóbrega chamou-o para fazer parte de seu programa na rádio Nacional.
O baú da felicidade
A origem do Baú da Felicidade não envolve diretamente Silvio Santos, mas sim Manoel de Nóbrega. Em 1957, um homem de origem alemã contatou-o para oferecer um serviço de cestas de Natal semelhante ao que ofereciam empresas como Columbus e Amaral, porém, em vez de produtos natalinos, seriam entregues brinquedos Basicamente, o comprador pagava com antecedência e recebia o produto final ao término do ano.
Foi oferecido a Nóbrega que investisse em anúncios da rádio, atribuindo sua credibilidade ao Baú, enquanto o alemão cuidaria do resto. O homem, porém, teria aplicado um golpe em Manoel e sumido com o dinheiro, fazendo com que muitas das cestas tivessem de ter o valor devolvido. Foi aí que o radialista pediu a Silvio que ficasse na empresa ajudando a ressarcir os clientes e pedir que não fossem à imprensa reclamar.
Silvio demorou, mas acabou cedendo aos pedidos do amigo. À época, o Baú da Felicidade ficava em um porão na rua Líbero Badaró, no centro de São Paulo. Ele expulsou o ex-sócio de Nóbrega do local, que tinha apenas uma mesa, algumas caixas, gavetas e máquinas de autenticar cheques, além de uma funcionária.
Depois de alguns dias, chegou à conclusão de que a iniciativa poderia render lucro, e passou a fazer algumas mudanças e investimentos. O negócio foi tomando uma proporção maior e mais variada, com louças e outros objetos domésticos além dos brinquedos. Nóbrega, com medo de um prejuízo ainda maior, decidiu sair do negócio, passando a empresa totalmente ao comando de Silvio Santos, o que foi visto como um grande ato de generosidade e fortaleceu os laços entre a dupla.
Início na televisão
Em 1961, com o crescimento do Baú, Silvio decidiu também buscar espaço na televisão, lançada onze anos antes e em fase de crescimento no Brasil. Sua estreia como apresentador foi em um programa chamado Vamos Brincar de Forca, na TV Paulista (comprada pela Globo em 1966), que contava com patrocínio do então deputado Carlos Kherlakian.
Com a boa repercussão, decidiu se arriscar e alugar um horário aos domingos, com o Programa Silvio Santos, que inicialmente tinha apenas duas horas de duração, começando ao meio-dia. À época, a emissora costumava ficar praticamente fechada aos domingos, contando, no máximo, com uma transmissão de futebol. Com shows, brincadeiras e prêmios baseados no Baú da Felicidade, a atração fez sua estreia em 1962 com quadros como o Cuidado com a Buzina, Só Compra Quem Tem, Pergunte e Dance e Rainha Por Um Dia. Na sequência, foi abrindo outras empresas e ganhando mais notoriedade perante o público. Em 1964, recebeu o seu primeiro Troféu Imprensa, como Melhor Animador.
Em 1965, o apresentador também investiu em um programa na TV Tupi, nas noites de quarta-feira, Festa dos Sinos. Posteriormente, seria mudado para Sua Majestade, o Ibope, Cidade contra Cidade e Silvio Santos Diferente, que migrou para a Record em 1976.
A saga pelo canal próprio
Com a Globo passando por algumas mudanças em 1971, o apresentador chegou perto de não ter seu contrato renovado com a emissora. Na mesma época, teve a oportunidade de comprar 50% das ações da TV Record de João Batista Amaral, o Pipa, então sócio de Paulo Machado de Carvalho Filho. Sem nenhuma concorrência aberta pelo governo para uma concessão, era a forma mais próxima que Silvio Santos teria de se aproximar do sonho de ser dono de um canal de televisão, ainda que em um período de crise. O negócio não deu certo e, para sua surpresa, o próprio Roberto Marinho contatou-o – sem saber do fiasco da negociação- pedindo para que ficasse mais um tempo na emissora, renovando sua permanência por mais cinco anos, com a condição de que não adquirisse as ações da concorrente.
Cerca de seis meses depois, os mesmos 50%, que haviam sido adquiridos pelo grupo Gerdau, foram colocados à venda novamente. Apesar do interesse, Santos não poderia comprá-los enquanto estivesse vinculado à Globo, e contou com a ajuda de um amigo, Joaquim Cintra Gordinho, para participar do negócio. Sua participação na Record seria vendida somente em 1989, quando a emissora foi comprada por Edir Macedo.
Surge a TVS
Silvio Santos conquistou a sua própria emissora de televisão em 1975, após esforços junto ao governo, principalmente ao ministro das comunicações, Euclides Quandt de Oliveira. Em 22 de outubro de 1975, o presidente Ernesto Geisel outorgou o canal 11 ao apresentador, pelo decreto nº 76.488. Surgia oficialmente a TV Studios Silvio Santos Ltda., mais conhecida como TVS. A oficialização do contrato ocorreu em Brasília, em 22 de dezembro daquele ano.
Na programação inicial da emissora, constavam alguns conteúdos comprados dos Estados Unidos, além de sessões de filmes que chegavam a ser exibidos três vezes seguidas, e seriados como Hazel, a Empregada Maluca e Joe Forrester. O Programa Silvio Santos era exibido aos domingos, e também ia ao ar simultaneamente pela Tupi durante algum tempo.
SBT
O SBT como conhecemos hoje, sigla para Sistema Brasileiro de Televisão, só surgiria oficialmente em 19 de agosto de 1981, quando a emissora tomou, de fato, proporção nacional.
O entretenimento sempre foi o carro-chefe. Hebe Camargo, Flávio Cavalcanti, Gugu Liberato, Ratinho, Raul Gil, Carlos Alberto de Nóbrega, Jô Soares, Serginho Groisman, Marília Gabriela, Otávio Mesquita, Celso Portiolli, Eliana, Angélica, Danilo Gentili, Maisa Silva, entre tantos outros, estão entre os apresentadores que estrelaram programas no canal ao longo das gerações. Todos, é claro, contemporâneos à presença de Silvio Santos, que se acostumou a tomar conta de boas horas da programação dominical. Hoje, é impossível pensar na história do SBT sem atrelá-la automaticamente ao apresentador.
O canal se acostumou a focar outra parcela de seu horário em programação infantil, com diversos desenhos e apresentadores como palhaço Bozo, Angélica, Eliana, Maisa Silva, Yudi Tamashiro e, mais recentemente, Silvia Abravanel, uma das filhas do apresentador, que assim como as irmãs Patrícia e Rebeca, também se aventuram em frente às câmeras. Outras atrações atingiram sucesso com os jovens em décadas distintas, com mais de uma versão, tanto estrangeiras como nacionais, como Chiquititas e Carrossel.
Novelas mexicanas, como A Usurpadora, Esmeralda, Maria do Bairro e Marimar, tornaram-se ‘marca registrada’ do SBT, com diversas reprises dubladas. Do país norte-americano vêm também Chaves e Chapolin, que fizeram sua estreia no Brasil em 1984, sendo exibidos até 2020, quando uma questão envolvendo os direitos autorais entre a Televisa e a família de Roberto Gómez Bolaños, criador da atração, impediu que os seriados continuassem sendo exibidos.
O primeiro telejornal da casa foi o Noticentro, em 1981. Na década de 1990, uma abordagem mais popular foi vista no Aqui Agora. Posteriormente, vieram atrações especiais como o SBT Repórter e o Conexão Repórter, de Roberto Cabrini. Entre os nomes que passaram pela emissora, constam Gil Gomes, Wagner Montes, César Tralli, Celso Russomano, Luiz Bacci, César Filho, Ana Paula Padrão, Sérgio Chapelin, Hermano Henning e Joseval Peixoto.
Nos anos 1980, Silvio Santos chegou a propôr que todas as emissoras de TV no Brasil reservassem o mesmo horário para exibir somente telejornais, por mais simples que fossem, com a intenção de incentivar o público a ficar inteirado das notícias diariamente. A ideia, porém, não foi concretizada.
*Com informações da Agência Estado