Letícia Rolim – Rios de Notícias
MANAUS (AM) – Pessoas diagnosticadas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) lutam diariamente pela aceitação na sociedade contra o preconceito. Em alusão ao Dia Mundial de Conscientização do Autismo, comemorado anualmente no dia 2 de abril, o Portal RIOS DE NOTÍCIAS conversou com pessoas que lutam diariamente pela inclusão.
A data, escolhida em 2007 pela Organização das Nações unidas, visa informar e reduzir casos de preconceito e discriminação contra pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA).
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André Araújo, recém-formado em jornalismo e diagnosticado com TEA, explica que desde a infância enfrenta dificuldades de interação e adaptação.
“Na minha infância eu vivia retraído, eu tinha problemas de interação, principalmente com a minha família, mas com o passar do tempo eu fui me adaptando às pessoas, fui me adaptando à rotina das pessoas”, contou Araújo.
Apesar das dificuldades, André não possuía diagnóstico de autismo e só tomou conhecimento de sua condição há quatro anos. A descoberta, inicialmente, abalou, mas depois foi fundamental para sua autocompreensão e aceitação.
“Eu não fazia ideia de que eu era autista, só descobri isso em 2020, no período da pandemia em uma consulta com um psicólogo. Quando eu descobri isso, parece que tudo desabou, parece que eu fui pra ruína, porque eu não queria aceitar a minha condição, o meu autismo”, revelou o jornalista.
Conquistas
Apesar das dificuldades e do impacto inicial do diagnóstico, André Araújo compartilha sua jornada de autodescoberta e superação. Para ele, ser autista não é um impedimento, mas uma oportunidade para mostrar seu potencial.
“Com o passar do tempo fui entendendo que eu sou uma pessoa normal como todas as outras, e que eu posso fazer coisas que as outras pessoas podem fazer, só que às vezes eu posso ser muito melhor. Uma pessoa autista é uma pessoa inteligente, uma pessoa capaz de fazer várias coisas”
André Araújo, jornalista
Essa mentalidade o impulsionou a enfrentar desafios e alcançar suas metas, como se formar recentemente em jornalismo e conseguir nota máxima no seu Trabalho de conclusão de curso (TCC).
“Eu me formei em jornalismo no dia 27 de março, porque eu acreditava em mim, eu acreditava no meu sucesso, no meu talento, na minha capacidade. A minha formatura, a minha colação foi uma vitória depois de uma luta intensa contra os desafios da faculdade e contra mim mesmo”, disse entusiasmado.
André ainda deixa uma mensagem para pessoas que estão passando pela mesma situação ou já passaram por desafios semelhantes.
“Você que é uma pessoa autista e que se considera incapaz, eu digo, não se considere incapaz! Se você acreditar em você, você é capaz de fazer qualquer coisa!”, disse Araújo.
Mãe atípica
Atuante na causa autista, a advogada Talytha Campos passou a participar mais de ações devido à experiência com seu filho Bernardo, de dois anos, diagnosticado com autismo classificado como nível de suporte 2.
“Minha entrada nessa luta foi motivada pela vivência de uma amiga, que também se chama Thalita, que compartilhou sobre o autismo de seu sobrinho. Ela falou sobre sinais, indicadores de autismo na criança, e a partir disso, percebi que o meu filho Bernardo apresentava os indicadores“, revelou Talytha.
Bernardo começou a apresentar sinais de autismo com um ano, incluindo a falta de resposta ao ser chamado pelo nome, ausência de fala e pouca iniciativa de interação social.
“Geralmente, uma criança, quando vê outras crianças, ela busca esse contato, ela busca essa socialização, nem que seja para brincar com um carrinho, com uma bola, nem que seja só para estar ali no meio. O Bernardo não tinha isso, ele era uma criança que pegava o que ele tinha de pegar e se isolava”, explicou Campos.
Além dos sinais apresentados, Bernardo também apresentou o hiperfoco, comum no TEA, e que acontece quando apresentam um interesse intenso e altamente focado em algo.
“Outra coisa também foi a questão da fixação dele, que é o hiperfoco dele em rodas, em carrinhos, tudo isso foi me chamando a atenção quando ele fez exatamente um ano de idade. Daí, com as minhas suspeitas, nós procuramos a pediatra do Bernardo”, citou a advogada.
Com a consulta a pediatra, Campos foi orientada sobre a questão de esperar o “tempo certo” para o desenvolvimento, que pode acabar por prejudicar a criança.
“A pediatra nos alertou que não tem essa questão de tempo da criança, ela tem os marcos de desenvolvimento e esses marcos, eles precisam ser respeitados. Se a gente for cair nessa de a cada criança tem o seu tempo, a criança às vezes ali tem um atraso, algo que pode ser resolvido e acaba sendo ali algo que vai prejudicá-la futuramente pela falta de ação naquele momento que foi apresentado”, disse Talytha.
Diagnóstico
Após as instruções, Bernardo foi encaminhado para a fonoaudióloga, que foi a responsável por fazer o primeiro alerta da possibilidade de ser TEA. A partir de então, a advogada enfrentou dificuldade de chegar ao diagnóstico de autismo. Talytha Campos começou então uma batalha contra obstáculos burocráticos e escassez de recursos médicos.
“Passamos meses lutando com o plano de saúde para conseguir acesso a um neuropediatra, essencial para fechar o diagnóstico. Infelizmente, enfrentamos muitas limitações, especialmente aqui no Amazonas”, compartilhou Talytha.
Apesar das dificuldades, finalmente conseguiram uma consulta com um neurologista que confirmou o diagnóstico de autismo para Bernardo. Foi esse momento que impulsionou Talytha a se envolver na causa autista, consciente das barreiras enfrentadas por pessoas com TEA e seus familiares.
“Ele necessita de fonoaudióloga, psicóloga, terapeuta ocupacional e terapeuta nutricional devido à seletividade alimentar. Além disso, um acompanhamento escolar adequado é fundamental, o que inclui uma assistente terapêutica para garantir seu bem-estar e desenvolvimento“, explicou Talytha.
Ativista na causa autista
Após o diagnóstico de Bernardo, Talytha Campos enfrentou uma nova batalha: obter os tratamentos necessários através do plano de saúde. No entanto, se deparou com resistência e diversos obstáculos burocráticos para conseguir que seu filho tivesse acesso a equipe multidisciplinar.
“Foi como se cometer um crime para eles. Alegaram que não estava incluído na cobertura da ANS, mas é importante destacar que o entendimento médico prevalece sobre as limitações dos planos de saúde. O plano deve se submeter à prescrição médica, não o contrário”, enfatizou Talytha.
Ela ressaltou a luta das mães de crianças atípicas, especialmente no Amazonas, em garantir o reconhecimento e acesso a terapias adequadas.
“Essa é a batalha das mulheres amazonenses, das mães de crianças atípicas. Buscamos o reconhecimento e efetivação do direito às terapias necessárias. Muitas vezes, recorremos ao judiciário quando não há outra opção. No entanto, mesmo após decisões favoráveis, as empresas nem sempre cumprem suas obrigações”, lamentou Talytha.
Como advogada e mãe atípica, Talytha se considera uma ativista na causa, lutando pela garantia dos direitos das crianças com desafios intelectuais.
“Sou uma ativista nesse campo, pois defendo o direito dessas crianças a terem acesso a terapias eficazes, contínuas e progressivas, com um vínculo terapêutico permanente sempre que possível. As empresas e os planos de saúde devem priorizar isso, pois lidar com crianças atípicas requer profissionais capacitados e especializados”, concluiu Campos.